Para as startups gaúchas, agora não é hora de pensar nos negócios perdidos, mas sim, de salvar vidas
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Em crises ou guerras, uma mesma pergunta ecoa com relutante frequência: qual é o próximo passo? No Rio Grande do Sul, a resposta ainda não existe.
“O foco total e absoluto está na questão do resgate e do acolhimento dos desabrigados”, afirma Pedro Valério, diretor-executivo do Instituto Caldeira, um dos principais espaços para o ecossistema de startups no estado gaúcho. O executivo conversou com a EXAME enquanto se deslocava pelo terceiro dia para atuar como voluntário e colaborar para com os resgates. ” A cidade está enfrentando um colapso. O que está acontecendo é indescritível”.
Nos últimos dias, essa é a rotina de milhares de gaúchos que mudaram as rotas – seja por necessidade, ao deixar os seus endereços, seja por vontade de ajudar a quem precisa. Muitos deles, funcionários e fundadores de startups, que usam os grupos do ecossistemas para fazer articulações tanto para ações de resgate em barcos, caiaques e jet skis quanto para a coleta de doações.
Os temporais que assolam o estado nos últimos dias já deixaram, segundo o último balanço da Defesa Civil, 90 pessoas mortas. O estado ainda contabiliza 132 pessoas desaparecidas e 361 feridas. Ao todo, mais de 1,3 milhão de pessoas de 388 municípios foram afetadas.
O senso de incerteza é o que define o momento. “Efetivamente, não se tem hoje nenhuma perspectiva de ter uma noção do real dano que isso vai ter em termos de ecossistema”, afirma Valério.
O próprio Instituto Caldeira, localizado em um galpão de 22.000 metros quadrados à margem do lago Guaiba, está inundado. O espaço fica no 4º Distrito, bairro conhecido por sediar outras startups.
Inaugurado em 2020, o centro de inovação se transformou rapidamente em um ponto de encontro para startups, CVCs, aceleradoras e empresas. De acordo com dados da plataforma Distrito, o estado conta com 956 startups ativas, mais da metade delas sediadas na capital.
Em alguns compartimentos, o volume de água no endereço supera dois metros de altura. “Nós temos várias startups que estão bem vinculadas à área de saúde e que estão na iminência de ter os seus serviços interrompidos porque, de fato, o hub está completamente inacessível”, diz o diretor.
Diariamente, circulavam pelo Caldeira mais de 1,600 pessoas, de uma base de mais de 130 empresas. Na sexta-feira, 3, o último grupo foi evacuado, antes da água começar a invadir o espaço por volta das 15 horas.
Entre eles, estavam os funcionários da Pix Force, uma deep tech de Porto Alegre com soluções de visão computacional e inteligência artificial. Com escritórios também em São Paulo e Rio de Janeiro, a startup tem 45 dos 110 na capital gaúcha.
“Felizmente está todo mundo bem, mas teve gente que perdeu casa, tem gente que tem que sair de casa e muita gente sem luz”, afirma Daniel Moura, cofundador e CEO da startup.
De acordo com o executivo, os impactos da crise no negócio serão percebidos ao longo do tempo. Mas, de cara, a startup contabiliza perdas de servidores, drones e câmeras, equipamentos que estavam no Caldeira e são usados para a criação dos produtos, de protocolos de segurança ao controle de qualidade.
A startup está buscando aplicar esse conhecimento para ajudar na localização de pessoas à espera de resgate. Com a melhora do tempo, a Pix Force tem usado a tecnologia desde ontem, com imagens satelitais de alta definição, para eventualmente localizar sobreviventes.
Outro importante ente de inovação no Rio Grande do Sul, o South Summit também tem focado em mobilizar os seus canais e redes em busca de apoio e recursos.
“O nosso foco, como South Summit, é usar os nossos canais para mobilizar, engajar, arrecadar recursos e donativos, a fim de que possamos, o quanto antes, entrar em um processo de reestabilização e possível retorno à normalidade”, afirma Thiago Ribeiro, diretor-geral do South Summit Brazil.
O evento, de origem espanhola, chegou a sua terceira edição em Porto Alegre. Neste período, encontrou nos galpões do Cais de Mauá, hoje totalmente tomado pela água, a sua sede, local que recebeu 23.500 pessoas no mês passado.
“Depois nós vamos pensar nas startups, sim, nós temos que ajudar também, é um compromisso nosso, mas a vida em primeiro lugar, as pessoas em primeiro lugar”, afirma Ribeiro.