Fundos ESG crescem no Brasil, mas investem pouco no agronegócio. Por quê?

Fundos ESG crescem no Brasil, mas investem pouco no agronegócio. Por quê?
Fundos ESG crescem no Brasil, mas investem pouco no agronegócio. Por quê?

Os chamados fundos “verdes”, focados em empresas que seguem padrões ESG (Ambiental, Social e Governança, na tradução da sigla em inglês), continuam crescendo no Brasil, mas ainda aplicam muito pouco em empresas do agronegócio.

De acordo com a Anbima (Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais), o patrimônio líquido dessas aplicações cresceu 81% entre dezembro de 2022 e março deste ano, chegando a R$ 13,4 bilhões. O número de fundos dedicados a investir em ativos sustentáveis saltou de 54 para 130 no período, aumento de 140%.

Mas a média de participação de empresas do agronegócio nesses fundos ainda é baixa – não supera os 10%, segundo análise realizada pelos pesquisadores Eduardo Brunaldi, Fernanda Kesrouani Lemos e Flávia Cruz de Souza Murcia.

Em artigo, eles citam que em 2016, esse percentual chegou a 14%, mas veio caindo ao longo dos anos seguintes – chegando ao mínimo de 4,8% em 2019. Nos últimos anos, houve recuperação, mas a participação ainda é muito abaixo do potencial.

“A desconfiança ainda é um dos fatores que impedem um avanço mais rápido”, afirma Rodrigo Fialho, sócio da PGLaw e especializado em ESG, citando o temor em relação ao chamado “greenwashing” ou “socialwashing” como um dos grandes problemas.

Greenwashing e socialwashing são terminologias em inglês utilizadas para identificar práticas adotadas por algumas empresas que, pressionadas a apresentar avanços em políticas de respeito à sustentabilidade e aos direitos humanos, maquiam e inflam dados para obter selos e certificados ESG.

Pesquisa da PwC divulgada no início deste ano aponta que 98% dos investidores brasileiros desconfiam dos relatórios de sustentabilidade das empresas. No mundo, o índice de percepção de greenwashing é de 94%.

Além do temor da falsificação ou maquiagem das informações, o fato de o Brasil ainda registrar desmatamento em áreas como o Cerrado pesa na avaliação dos fundos – especialmente geridos por instituições europeias – na hora de escolher onde investir.

Henri Rysman, gestor de renda fixa e multimercados e especialista em ESG do banco francês BNP Paribas, explica que empresas com atuação em regiões como a Amazônia ou o Cerrado dificilmente passam nos critérios de escolha de investimentos da gestora.

“Temos critérios e metodologias muito rigorosos. Não financiamos empresas que produzem ou compram soja ou proteína animal em territórios que foram desmatados depois de 2008”, diz, mencionando uma exigência ainda superior à prevista na ‘lei antidesmatamento’ da União Europeia, que entra em vigor no final do ano.

Na Europa, 95% dos fundos abertos do BNP já seguem critérios de investimento ESG. No Brasil, onde o banco tem portfólio de R$ 90 bilhões – apenas 3% desse volume é de fundos verdes. “Queremos igualar à Europa nos próximos anos”, disse Rysman em entrevista ao AgFeed.

Esse percentual corresponde a R$ 2,7 bilhões, o que coloca o BNP entre os bancos mais alavancados nesse tipo de investimento quando comparado com o restante do mercado brasileiro.

A Anbima divide os fundos verdes em duas categorias: IS (Investimento Sustentável) e ESG. O primeiro é composto por fundos que têm a sustentabilidade como objetivo final dos investimentos, enquanto o segundo é composto por fundos que aplicam em empresas que seguem os critérios ESG, mas que não têm o investimento sustentável como objetivo principal.

Em abril desse ano, 91 dos 130 fundos verdes classificados pela Anbima era da categoria IS – com portfólio total de R$ 9,1 bilhões – aumento de 62% em relação a dezembro de 2022. Já os fundos ESG passaram de R$ 1,8 bilhão para R$ 4,3 bilhões – alta de 138%.

Mas nem todo o agronegócio fica de fora do mercado dos fundos verdes. Empresas focadas na produção de energia limpa – ou investindo em transição energética, tem espaço na lista dos investidores.

O Índice de Sustentabilidade da B3, o ISE, conta com 78 empresas, das quais 11 são do segmento energético e cinco atuam com produção de alimentos, entre eles proteína animal e grãos – caso de BRF, Minerva e SCL Agrícola.

O potencial desse mercado ESG no Brasil – incluindo o de mercado de carbono – chega a US$ 120 bilhões, segundo estimativas do Itaú BBA. Globalmente, a estimativa é de que esse tipo de ativo já represente um terço do total de ativos sob gestão, podendo chegar a US$ 53 trilhões até 2025, segundo levantamento da Bloomberg Intelligence.

“Hoje, quem investe em ESG no Brasil são grandes empresas que têm compromissos e metas de sustentabilidade a cumprir e alguns Family offices. Ainda falta educar o investidor individual para que ele ganhe confiança”, diz Rysman, do BNP.

Relatório do Morgan Stanley Institute for Sustainable Investing apontou que o interesse dos investidores individuais por sustentabilidade tem crescido – 77% dizem se interessar por investir em fundos e empresas que olham para os critérios ESG.

No Brasil, levantamento realizado pela Michael Page apontou o crescimento de 50% na busca de profissionais ESG no setor do agronegócio. É sinal de que o setor está preocupado com o tema e atento às formas de financiamento que complementam o plano safra e as emissões de CRA, LCAs e os Fiagros.

Uma parceria do Rabobank Brasil com a Agrotools começou a monitorar via satélite as áreas financiadas/dadas em garantia nas operações do banco, em especial no Centro-Oeste, como forma de prestar contas aos investidores.

O mercado financeiro não existe sem informação. Quanto melhor e mais transparente ela for, melhor será para os investidores – e para quem precisa de financiamento.