Estimado em US$ 120 bi, mercado de carbono brasileiro aguarda regulação para deslanchar

Estimado em US$ 120 bi, mercado de carbono brasileiro aguarda regulação para deslanchar
Estimado em US$ 120 bi, mercado de carbono brasileiro aguarda regulação para deslanchar

Apresentado como a nova commodity brasileira e estimado em US$ 120 bilhões até 2030, segundo o Banco Mundial, o mercado de crédito de carbono brasileiro aguarda regulação para, de fato, deslanchar e atingir todo o seu potencial.

Segundo especialistas, apesar das iniciativas voluntárias promovidas pelo setor privado, a falta de regulamentação limita o avanço por gerar incertezas jurídicas e não oferecer regras claras para a formação de preços ou para negociação dos ativos.

“Precisamos ter um mercado de carbono regulado para endereçar o desafio da descarbonização. Sem comando e controle – ou seja, participação do governo – ele não terá resultado satisfatório”, afirma Yuri Rugai Marinho, CEO da Eccon Soluções Ambientais.

Parte dessa demanda vem sendo endereçada, mas no ritmo do Congresso Nacional, que analisa projetos de lei sobre o tema desde 2015.

O mais avançado, o PL 2148/15 consolidou 11 propostas, foi votado e aprovado pelo Senado em outubro do ano passado, mas retornou à Câmara dos Deputados devido às alterações no projeto original – entre elas a exclusão da regulamentação para setores do agronegócio, como a produção de insumos ou matérias-primas. Aprovado em 21 dezembro de 2023 pelos deputados, agora aguarda nova votação no Senado, sem data para acontecer.

Um dos objetivos do PL é criar o Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SBCE), que estabelecerá teto para as emissões e regras para a venda de títulos de compensação e geração de créditos por emissões de gases de efeito estufa (GEE).

“O atraso na regulamentação torna mais lento o processo de descarbonização da economia e faz o mercado voluntário perder tração. Se não criarmos regras nacionais, o Brasil dificilmente vai reduzir suas emissões”, diz Marinho.

Há uma diferença entre o mercado voluntário e o regulado. No mercado voluntário, o que existe é um acordo entre as empresas – que compram e vendem – para que elas atendam suas próprias metas de descarbonização. Quando o mercado é regulado, existe um teto fixado pelo governo – ou reguladores – que precisa ser cumprido por força de lei.

O mercado voluntário de carbono pode chegar a US$ 40 bilhões até 2030, segundo estimativa de estudo recente do Boston Consulting Group (BCG). Mas entre 2020 e 2021, o valor desse mercado era de US$ 2 bilhões – ou seja, menos de 5% do seu potencial.

Outro levantamento, do Banco Mundial, estima que o Brasil pode ter receitas com créditos de carbono de até US$ 120 bilhões até 2030, considerando o preço do crédito em US$ 100 por tonelada, o que, segundo o banco, é um cenário otimista e de alta demanda.

Atualmente, a oferta brasileira corresponde a cerca de 12% das emissões mundiais (45,28 milhões de toneladas de CO2 em créditos de carbono no mercado voluntário em 2021), valor quatro vezes maior do que a participação de 2019.

O Banco Mundial aponta ainda que mais de 30 países tinham regras para compensar a emissão de carbono e gases de efeito estufa em 2021 – o que representava apenas 23% do total de emissões globais.

“No Brasil, o PL parece que vai avançar, mas há outras regulamentações que precisam ser analisadas para o mercado de carbono, de fato, se consolidar”, diz Rodrigo Fialho Borges, sócio do PGLaw Advogados e especializado em ESG.

Borges cita como exemplo a CVM (Comissão de Valores Mobiliários) que ainda não considera o crédito de carbono como um ativo mobiliário, ou seja, aqueles que podem ser negociados no mercado financeiro por meio da bolsa. “O próximo passo é revisar as normas da CVM”, diz.

O BCG menciona em seu estudo que, mesmo sendo um mercado com potencial imenso, também existem muitas preocupações com a qualidade da captura de carbono, especialmente na agricultura, justamente pela falta de regulamentação que defina e padronizar metodologias e métricas que possam partir de uma base unificada para auditar os cálculos das emissões.

O estudo do BCG aponta alguns métodos que podem contribuir com o sequestro de carbono no solo – remoção do dióxido de carbono (CO2) da atmosfera e armazenamento em reservatórios naturais. A previsão é que esse formato de captura chegue a 5 gigatoneladas por ano até 2050.

E essa não é uma realidade exclusiva do Brasil. Outro levantamento do Banco Mundial mostra que os níveis globais do preço do carbono continuam baixos, o que tem dificultado o cumprimento das metas do Acordo de Paris – de limitar o aquecimento global a 1,5ºC.

Segundo o banco, atualmente, menos de 1% das emissões globais de gases com efeito de estufa são cobertas por um preço direto do carbono igual ou superior ao intervalo recomendado pela Comissão de Alto Nível sobre Preços do Carbono – formada por 13 especialistas internacionais em emissões de gás carbônico (CO2) e validada pelo G20.

De acordo com o relatório anual do Banco Mundial chamado “Estado e Tendências da Precificação do Carbono em 2024”, no ano passado, as receitas da precificação do carbono atingiram um recorde de US$ 104 bilhões. O relatório aponta que existem atualmente 75 instrumentos de precificação de carbono em operação em todo o mundo.

A Câmara de Comércio Internacional e a consultoria WayCarbon estimam que o Brasil tem capacidade para atender 48,7% da demanda global por créditos de carbono no mercado voluntário, que deve chegar entre 1,5 bilhão e 2 bilhões de toneladas de CO2 no fim da década. Mas este é o menor mercado de carbono. O grande potencial está no mercado regulado, que segue legislação e regras fixadas pelos governos, que terão a real capacidade de fiscalização.

De olho nesse potencial, empresas privadas estão desenvolvendo suas próprias metodologias e plataformas. Uber e Ifood, por exemplo, vendem créditos dentro de seus aplicativos e o Itaú lançou recentemente o Project Carbon, uma plataforma de compensação de carbono desenvolvida em parceria com os bancos Canadian Imperial Bank of Commerce (CIBC), National Australia Bank (NAB) e o Grupo NatWest.

“O Brasil pode e deve se posicionar como potência nesse mercado”, disse Luiza de Vasconcellos, head de Negócios ESG do Itaú BBA em evento realizado pelo banco recentemente e acompanhado pelo AgFeed. “Mas ainda há muito trabalho a ser feito para construir as condições para que o mercado seja acessível a todos”, conclui.