Caramuru e Banco BV fazem operação de “câmbio verde” para financiar compra de grãos

Caramuru e Banco BV fazem operação de “câmbio verde” para financiar compra de grãos
Caramuru e Banco BV fazem operação de “câmbio verde” para financiar compra de grãos

Em tempos de crédito mais caro e escasso, exibir um selo verde e incluir indicadores de sustentabilidade nas operações financeiras pode ser um atrativo para viabilizar negócios a taxas mais baixas.

A Caramuru Alimentos, uma das maiores empresas de processamento de grãos do País, usou essa estratégia para acessar recursos em uma operação original junto ao banco BV.

As duas empresas acabaram celebrar o fechamento de um acordo para o primeiro Adiantamento de Operações de Câmbio (AOC) sustentável, no valor de R$ 10 milhões.

O montante de recursos é até modesto para um grupo do porte do Caramuru, que demanda cerca de R$ 6 bilhões em capital por safra. Mas o movimento tem sentido simbólico relevante.

Antes conhecido no mercado como ACC (Adiantamento sobre Contratos de Câmbio), o AOC é uma modalidade de proteção cambial que permite às empresas anteciparem recursos financeiros a serem recebidos nas fases pré-embarque das mercadorias.

No caso desta operação, especificamente, as condições atreladas à indicadores de sustentabilidade demonstram a possibilidade real de obter valor a partir da demonstração do uso de boas práticas em vários processos dentro da agroindústria.

A Caramuru pretende utilizar os recursos para comprar soja, milho e girassol de produtores que participam de seu programa chamado “Sustentar”, com foco em agricultura de baixo carbono e práticas sustentáveis.

Atualmente, são 711 produtores da base de mais de 5 mil fornecedores da Caramuru que fazem parte da iniciativa. “Começamos o programa em 2015 e ele conta com 164 indicadores para que o produtor rural receba esse certificado”, explicou Júlio Costa, diretor-presidente da Caramuru.

Além de comprar grãos de cultivos com menor emissão de carbono, a empresa usará parte dos recursos para contratar serviços de transporte com baixa emissão de gases de efeito estufa (GEE), além de investir em outros modais, que colaborem neste sentido.

Costa afirma que o dinheiro servirá primordialmente para a compra de soja, pois o recurso veio em meio ao “calor da comercialização da oleaginosa”, por conta da dinâmica da safra.

“Nos primeiros quatro meses do ano nós formamos o estoque para processar ao longo do ano. Grande parte da soja vira biodiesel, que representa mais de 30% da nossa receita”, conta. A empresa também utiliza o grão para produzir óleo e farelo.

Como antecipa uma parte do valor que a empresa vai receber, na prática, o AOC ajuda melhorar o fluxo de caixa do negócio.

Na Caramuru Alimentos, esse instrumento também pode ser utilizado como proteção contra variações cambiais, ou seja, como instrumento de hedge, visando equalizar os ativos e passivos em dólar da empresa.

Gustavo Pinori, superintendente de agronegócios do banco BV, explica que a instituição formatou um AOC em uma estrutura sustentável por identificar que a Caramuru já tinha o projeto pronto para adquirir grãos de agricultores com premissas sustentáveis.

Segundo Júlio Costa, a empresa possui uma relação de quase 20 anos com o BV e fez esse acordo pela importância do capital de giro e também para dar tração às ações de sustentabilidade da companhia.

“Um dinheiro ‘barato’ é bom, e com um viés sustentável é melhor ainda. Esse recurso veio muito bem a calhar”, afirmou ao AgFeed.

As duas empresas não divulgam qual a taxa de juros que foi praticada. A Caramuru informou apenas que são “taxas competitivas”.

Antes de assumir o posto de diretor-presidente, a trajetória de cerca de 40 anos de Júlio Costa dentro da Caramuru englobou a área financeira, que sempre teve o BV como parceiro estratégico.

Segundo ele, o BV abriu as portas para a Caramuru acessar o mercado de capitais. “Hoje temos mais de R$ 1 bilhão no mercado em CRAs”, afirma.

“Estávamos com a Caramuru num momento de investimento e crescemos no relacionamento com a companhia”, contou Pinori, do banco BV.

Segundo ele, a instituição, ligada ao grupo Votorantim, atua no agro desde “antes do furor da Faria Lima”. Hoje 23% da carteira de atacado do banco está ligada ao setor, envolvendo produtores, empresas de químicos, cooperativas, usinas e esmagadoras.

Ao final do primeiro trimestre deste ano, essa carteira do agro da instituição somava R$ 6 bilhões. A estratégia engloba tanto crédito direto para empresas quanto por meio de compra de carteiras de recebíveis, no caso dos produtores pessoa física.

Pinori acredita que as operações sustentáveis devem crescer no banco, por ser uma tendência de mercado. “Acreditamos que nesse quadrimestre somos o segundo no ranking de operações ESG para distribuir no mercado”, afirma o superintendente.

O banco BV diz que já fez 5 operações ESG que cumpriram as boas práticas dos principais standards mundiais (ICMA, LMA e IFC) e o Guia da ANBIMA de Títulos ESG. Foram contratos com foco em saneamento, energia renovável, agronegócio de baixo carbono e Infraestrutura, sendo um green loan, um green bond, dois sustainability bonds e um blue Bond.

A meta da instituição é distribuir e originar R$ 80 bilhões até 2030.