“Apenas os grandes têm musculatura para atender as exigências europeias”, diz GRI

“Apenas os grandes têm musculatura para atender as exigências europeias”, diz GRI
“Apenas os grandes têm musculatura para atender as exigências europeias”, diz GRI

Com previsão para entrar em vigor em 20 de dezembro deste ano, o Regulamento da União Europeia para Produtos Livres de Desmatamento (EUDR, na sigla em inglês), ou Lei Antidesmatamento, como é chamada no mercado, não é apenas mais um obstáculo para as exportações agrícolas de produtores de países em desenvolvimento como o Brasil.

Na avaliação da colombiana Andrea Pradilla, diretora para a América Latina do GRI (Global Reporting Initiative), organização internacional independente que desde 1997 se tornou uma referência mundial na elaboração de relatórios de sustentabilidade, as exigências fixadas pela União Europeia são, na verdade, apenas um primeiro passo para outras que virão.

“As diretrizes que visam reduzir os impactos no clima estão dadas e só continuará atuando – e exportando – quem se adequar a elas”, disse a executiva em entrevista ao AgFeed na semana passada, quando esteve no Brasil para participar de um evento que discutiu bem-estar animal, organizado pela startup Produtor do Bem.

Andrea lembra que além das reduções nas emissões de gases do efeito estufa (GEE), os europeus estão atentos a questões relacionadas aos direitos humanos. “Essa é uma tendência que não tem volta”, afirma.

Ou seja, mais do que reduzir impactos ambientais e no clima, as regras da UE – e as que virão a seguir – terão olhar mais diligente para temas sociais, o que implica não apenas melhores condições de trabalho no campo, mas também relacionadas às populações nativas.

Segundo ela, a “régua” terá que ser mais alta daqui em diante e as empresas não podem se preocupar em apenas atender o que está lei dos países onde operam, mas ir além para se enquadrar em padrões de exigência que tendem a ser globais.

“Será um exercício contínuo de adaptação, no qual as empresas precisarão ser flexíveis”, disse, lembrando que pode levar um tempo – entre dois e três anos – para que as empresas que vendem para União Europeia possam se adaptar às novas regras.

No caso do Brasil, que lidera o comércio de diversas commodities, incluindo agrícolas, os desafios não são diferentes. “Apenas grandes empresas estão preparadas para cumprir as exigências e continuar exportando para a União Europeia quando as novas regras entrarem em vigor”, disse.

Andrea lembra que há exemplos de grandes corporações brasileiras, incluindo agrícolas, que já exportam e atuam em outros países, o que as obriga a ter maior controle em termos de governança de dados – o que inclui ferramentas de rastreabilidade da produção – e condições para atender as exigências do mercado internacional.

Para os pequenos e médios, o apoio dos governos será essencial, pois sozinhos eles não terão estrutura para catalogar e reportar todas as informações que passarão a ser exigidas daqui em diante e dentro dos critérios que estão sendo adotados.

“É um desafio de governança também”, diz a executiva, explicando que além de cumprir as exigências de responsabilidade social e ambiental, será necessário comprovar essa regularidade por meio de processos e certificações que validem o que está sendo feito dentro da porteira e no caminho do produto até o consumidor final.

Financiamento

A executiva do GRI mencionou ainda que outro desafio será o financiamento das operações, pois cada vez mais fundos de investimento e bancos europeus e americanos estão incluindo critérios ESG na hora de selecionar para quem serão destinados os recursos.

“As grandes empresas têm uma boa musculatura quando se trata de reportar, em particular, números e dados que mostrem seus níveis de comprometimento”, afirma, lembrando que, no caso do Brasil, as companhias que estão listadas na B3 – a bolsa de valores brasileira – são ainda mais bem posicionadas.

Segundo ela, será um processo complexo não apenas para o Brasil, mas para muitas empresas – em especial do agronegócio – da América Latina. Ela lembra que na região, a questão do desmatamento é extremamente séria e o que eleva as emissões de GEE especialmente na indústria agropecuária.

“As regras da União Europeia são apenas um início, pois em breve outros países irão editar normas semelhantes”, disse, ao comentar sobre o fato de a Europa não ser mais um dos principais mercados para o agronegócio brasileiro.

Segundo ela, devido ao impacto ambiental significativo, a produção de alimentos e a sustentabilidade do agronegócio, em especial na pecuária, são cruciais para o Brasil, que pode garantir crescimento econômico de longo prazo ao intensificar suas práticas sustentáveis e mitigando alterações do clima, associadas a uma boa governança e à transparência.

“Se eu pudesse dar uma recomendação às empresas, eu diria que elas devem subir suas réguas de exigência para além do que a legislação local prevê e o que as normas internacionais exigem”, diz Andrea, lembrando que o mundo hoje é feito de percepções e que irá se destacar quem conseguir além de cumprir o que a lei exige, atender positivamente as expectativas de quem compra e no final, financia, a produção.